Reflexões

Você quer bater na igreja?

Quando adolescente ouvi uma “piada” machista mais ou menos assim: “Um homem, cansado da rebelião da sua esposa, querendo manter o seu cavalheirismo diante dos amigos, comprou um capote e todas as vezes que ficava com raiva da sua mulher, mandava ela vestir o capote e passava a agredi-la. Quando arguido sobre sua conduta ele respondeu que não estava batendo na esposa, mas apenas surrava o capote.” Acho que era assim.

Nesta madrugada, eu me lembrei desta piada nojenta ao refletir sobre algumas agressões que a igreja do Senhor vem sofrendo. Não se trata de violência externa, pois esta, até glorifica a Deus e é uma honra para os que sofrem por causa do Nome do Senhor Jesus. Refiro-me aos insultos que a igreja sofre por parte de vários irmãos e até líderes brasileiros renomados, conceituados e considerados homens de Deus.

No final da década de 80, fui desligado de uma denominação sumariamente por causa da renovação espiritual e por não suportarem as minhas muitas debilidades. Na verdade, não apenas eu, mas todos os irmãos que caminhavam comigo. Alguns anos depois, o meu amado pastor voltou atrás na decisão da assembléia e rasgou publicamente o documento que nos desligou da denominação. Apesar disso, não retornamos e nunca mais nos unimos a qualquer outra denominação. Naquela ocasião, era uma verdadeira heresia uma comunidade de discípulos não caminhar debaixo de uma denominação histórica. Quando alguém nos perguntava o nome da igreja a qual pertencíamos, além da dificuldade para explicar a nossa compreensão de igreja, enfrentávamos também o preconceito daqueles que só aceitavam as igrejas dentro das denominações famosas. No entanto, mesmo acusados de “seita”, seguimos o nosso caminho e graças a Deus vimos que o Senhor tem sido conosco desde então.

Com o passar dos anos, nós testemunhamos vários enganos, pecados e escândalos envolvendo as instituições religiosas cristãs, tanto evangélicas, quanto católicas. Eu confesso que fui pronto para repudiar e até acusar as ditas organizações por seus descaminhos que obstruíam os avanços da verdadeira igreja. Não havia a mídia que existe hoje, por isso eu usava os púlpitos, em várias ocasiões, para falar contra as denominações evangélicas denunciando as estruturas que impediam a vida de comunhão da igreja de Cristo. Falei também contra as idolatrias católicas e seus equívocos doutrinários. No entanto, depois de adulto, e mais quebrantado, fui criticado por alguns por me calar diante dos erros denominacionais. O curioso é ver na atualidade alguns pastores fazendo o caminho oposto, ou seja, quando jovens, desfrutavam e defendiam cada um a sua própria denominação e ao chegarem a fase adulta, começam a desferir golpes contra elas. Ou eu estou mais débil ou eles estão recém entrando na puberdade espiritual. Pelo meu silêncio, alguns amados já disseram que estou velho e que perdi a minha espada em algum lugar. Mas o fato é que pelo menos duas verdades me fizeram refletir e encheram o meu coração de temor e cuidado:

  • Muitos que estão sendo enganados, buscam mestres segundo os seus próprios desejos. Ou seja, mais do que enganados por uma liderança corrupta, estão se auto-enganando. Isso já foi profetizado pelo nosso querido apóstolo – “Pois haverá tempo em que não suportarão a sã doutrina; pelo contrário, cercar-se-ão de mestres segundo as suas próprias cobiças, como que sentindo coceira nos ouvidos; e se recusarão a dar ouvidos à verdade, entregando-se às fábulas” (2 Timóteo 4:3-4). Como ajudar a estas pessoas? Atirando em suas denominações ou confrontando-as quando oportuno?
  • Outro cuidado é com o trigo, os verdadeiros discípulos. Como separar o “joio” sem excluir o trigo? Esta tarefa, os próprios anjos indignados desejavam fazer. Chegaram a perguntar: Podemos arrancar o joio? – Não! Replicou ele, para que, ao separar o joio, não arranqueis também com ele o trigo. (Mateus 13:29) – Se é impossível para os anjos esta cirurgia, imagine para mim.

Nesta madrugada, eu estava lendo uma carta de um pastor revoltado com as instituições evangélicas. Compreendo claramente sua indignação. Na verdade, eu penso que poderia me indignar com mais liberdade do que ele, pois como disse, desde a década de 80, estou fora da denominação evangélica. Fomos batizados de “seita” há muito tempo. Mas apesar disso, tenho amigos e irmãos mui amados em vários grupos evangélicos e até dentre os católicos.  Por esta causa , inclusive, já fui acusado mais de uma vez de ser um fomentador do “ecumenismo”. No entanto, eu me identifico com a Igreja do Senhor, mesmo considerando o seu estado atual de frieza e apostasia. Sou parte deste corpo! O que afeta a esta igreja que não me afeta? O Pai é Nosso, o pão de cada dia é nosso e até os pecados também são nossos. Sou amigo de evangélicos e católicos sem ser parte de suas denominações. Relaciono-me muito bem com vários irmãos, sem precisar me relacionar com suas instituições religiosas. Sou tão bem acolhido entre eles que até tenho tido a oportunidade de confrontar alguns erros com a verdade. Combater a idolatria ,tanto evangélica quanto católica.

Enquanto refletia sobre a indignação do pastor, lembrei-me da piada hedionda do capote, pois pensava: “Será que consigo bater na organização sem ferir o organismo? Será que existe uma forma de atacar o joio sem quebrar o trigo? Ou eu corro o risco de atuar como o cara da piada sem graça, ao dar os meus socos no capote acabo machucando a noiva de Cristo?”

Não me recordo de ter visto Jesus falando mal da religião dos outros. Nem Ele e nem os seus apóstolos (enviados). Não atacaram as seitas dos Fariseus e nem a dos Saduceus. Não li nenhuma ofensa contra qualquer religião. Vi sim o Senhor denunciando os pecados dos homens, religiosos ou não. Assim como os seus profetas, Jesus confrontou cada um na sua própria miséria, sem deixar de lado a Sua misericórdia. Não vi o Senhor Jesus atacar autoridades. Um dia Paulo por equívoco, agrediu com palavras uma autoridade do seu povo e assim que tomou ciência do seu engano, confessou o seu pecado (Atos 23:3-5).

Creio que devemos, à semelhança do Nosso Mestre e dos Seus enviados, confrontar o pecador, denunciando o seu pecado. Paulo e João, o apóstolo do amor, chegam a identificar alguns irmãos que estavam em pecado. Dentre eles, Alexandre, o latoeiro, e Diótefres. (II Timóteo 4:14 – II João 1:9) Eles deram “nomes aos bois” jogando luz no verdadeiro causador do problema.

O Senhor, orientou a Seus discípulos percorrerem um caminho de confronto em amor para tratar daqueles que vivem em pecado no seio da igreja e permanecem sem arrependimento. São como ovelhas perdidas (Mateus 18:15-20), disse Jesus. Para o confronto pessoal, encontro base nas Escrituras, mas para atacar as organizações religiosas, não vi nada ainda. Se porventura, alguém que está me lendo agora, tiver algum texto, peço humildemente que me ajude.

Quando o assunto é falar dos erros da igreja, eu temo atirar no que vi e acertar o que não vi causando tristeza e dor ao corpo de Cristo. Não quero bater do capote e ferir o Corpo do Nosso Senhor. Não quero ouvir Jesus me dizer: – “Franco, Franco, por que me persegues?”

Estou convencido de que há um grande risco em atacar uma organização cristã. Ela normalmente é uma capa usada para identificar uma comunidade local de discípulos. Em qualquer igreja existem muitos irmãos amados. Alguns podem estar atolados no pecado, mas sempre há um remanescente que não contaminou suas vestes.

“Tens, contudo, em Sardes, umas poucas pessoas que não contaminaram as suas vestiduras e andarão de branco junto comigo, pois são dignas” (Apocalipse 3:4).

No amor do Senhor Jesus,

Sérgio Franco
Autor do livro Tudo se Resume no Amor de Deus, que pode ser encontrado na loja Servo Livre e também  no formato e-book na Amazon.

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