Reflexões

O que é “se tornar como criança”?

“E disse: Em verdade vos digo que, se não vos converterdes e não vos tornardes como crianças, de modo algum entrareis no reino dos céus” (Mateus 18:3)

Estou convencido que se tornar como uma criança é uma decisão. Embora Jesus não tenha ensinado ninguém a aderir ao comportamento de uma criança, Ele indica a essência desprendida, sem formalidades, a simplicidade, a fidelidade do coração e sobretudo a incapacidade de uma criança. Até por que, se fôssemos nos tornar em tudo como crianças, isso significaria viver com a mesma responsabilidade delas, com as mesmas exigências de quem não sabe compreender o tempo das coisas, que não sabe o valor delas. Mas, pelo contexto em que Jesus disse isso, entendemos muito bem o que quis dizer. Os discípulos o abordaram e o questionaram sobre quem seria o maior no Reino. Papo de gente grande, de quem está disputando um cargo melhor no emprego, de quem quer ser visto, de quem aprecia as hierarquias.

Esse tipo de conversa revela o que muitas vezes passa no nosso coração. Eu vejo os discípulos de Jesus, suas deficiências e características, muitas vezes como tipos do que somos. Me identifico com suas deficiências. Eles eram gente comum que representam o tipo de pessoa que se aproxima de Jesus. Gente falha, com complexos, interesses dúbios mas que tem um coração disposto a deixar tudo por Ele e que se perseverar até o fim alcançará uma transformação completa.

Porém, no meio da caminhada muitas vezes nos deparamos com decisões, escolhas que devemos tomar, caminhos que devemos trilhar e que exigem de nós deliberar sobre que tipo de postura teremos: um coração de quem sabe o que faz e só depende de si ou um coração de criança. E talvez o mais singular desse tipo de coração seja o reconhecimento da incapacidade de viver só. Se alguém se atreve a abandonar uma criança, pela lei pode ser processada por abandono de incapaz. Por que será que essa lei foi pensada e articulada? Por que uma criança é incapaz de se virar sozinha. Mas quem hoje é humilde o suficiente pra reconhecer que não pode? Que depende? Que precisa?

Como criança na malícia

Paulo replica o ensino de Jesus ao evidenciar esse princípio:

“Irmãos, não sejais meninos no juízo; na malícia, sim, sede crianças; quanto ao juízo, sede homens amadurecidos” (1 Coríntios 14:20)

A criança não é exercitada na malícia. Não que elas não a tenham. É só lembrar que mesmo quando crianças somos todos criaturas caídas que carecem da glória de Deus. A malícia de uma criança é pouco articulada e ao mesmo tempo ingênua. A criança também não é humilde por natureza mas geralmente reconhece suas limitações e incapacidade. Ela sempre pede pelo colo do pai. Meu filho de 2 anos quando se vê em uma situação que ele identifica como perigosa imediatamente recorre ao meu colo. Não tem vergonha de dizer também que está com medo. Ele é bem autêntico. E diante do desconhecido estou sempre o ensinando o quanto ele pode realizar e também sinalizo os perigos. Quando tenta me enganar para se beneficiar, dificilmente tem sucesso ao usar da malícia pouco exercitada dele.

Como homens amadurecidos

Essa ordem pode aparentar uma contradição com o ensino de Jesus, mas não. Ao nos ensinar sobre se tornar como crianças, Ele está simplesmente tocando nas raízes do coração rebelde, independente e soberbo do ser humano. E é dessas coisas que devemos converter o caminho, mudar de direção. É isso que leva os homens para o buraco: a necessidade de andar só, de dizer que ninguém manda na gente, as muitas reservas com autoridade, o medo de ser controlado, o desejo de ser visto, a sede pelo poder etc. Jesus combate tudo isso nos ensinando a ter um coração de criança. Porém o alvo que Ele tem é que nos tornemos homens amadurecidos na capacidade de entender as coisas espirituais. Ele deseja que sejamos exercitados no juízo orientado pelo Espírito. Não no juízo da carne que julga pelas aparências, pelas simples evidências. Jesus em forma humana ensinou como ser alguém de grande discernimento. Ele discernia os corações, os motivos e julgava com um juízo que não é desse mundo.

Eu tenho um pedido a Deus: Que não quero viver como menino, mas quero ter um coração de criança. Quero permitir que o Pai me conduza pela mão e pra isso peço a Ele que me faça crescer no discernimento das coisas espirituais mas também quero que Ele use meus irmãos, sem medo, sem justiça própria, reconhecendo Ele em tudo e consciente de que os homens podem errar, mas o Pai não.

Ideraldo de Assis
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